Tenho medo das cores que na pálida flatulência da luz se criam.
Esborratadas.
Balançando cobardemente no candeeiro ao fim do passeio.
Tenho pena das traças, que cinzentas, ardem em vestidos de azul.
Atarantadas.
Bailando sempre fora do vidro.
Tenho inveja daquela estrela, que presa à distância e a outro meridiano o trespassa.
Intocável.
Estalando-o por entre as rachas.
Tenho raiva de mim pela quimera inocente de lhe tentar mudar a lâmpada.
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
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quinta-feira, 16 de setembro de 2010
Uma mesa manchada de vinho de onde bebo palavras bêbadas,
já sem sentido ou cor.
Na crueza das lágrimas que enchem o copo entendo o que tirar do fruto.
Estes paralelos estão errados. Manchados. Puídos.
Um cigarro arde sozinho até ao filtro. Tortuosamente fumegando sobre si mesmo numa trajectória levianamente aleatória.
Acedia-me a sua casualidade efémera.
Penso nos carros a percorrer a cidade ao acaso. Penso no Bom Jesus e nos botes à deriva.
Revolto-me com a minha ineptitude de sentido e espaço.
Tantos gritos ocos e tantos beijos mudos.
Tanta saliva e manchas de bâton em copos tombados.
Este céu tem poucas estrelas...
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quarta-feira, 21 de julho de 2010
Estas ruas cheiram a velho e a luzes pálidas.
Percorre-as uma mulher louca que geme em cada passo.
Rasga os cabelos por um amor que está em nojo.
Quem quer está sepultado. E a terra é longe. E tem deuses mortos.
Sublinha o xadrez das calçadas de vermelho. Seus pés estão descalços.
E chora...
Seus soluços soam ao kitch de teatro do populacho. Cantados e falsamente doridos.
Seu coração esmigalhado não lhe dá asas à sinceridade. Só à luxuria.
E geme, manchando onde passa. Descalça e descuidada. Que só os vidros lhe dão prazer.
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terça-feira, 4 de maio de 2010
O fado não é triste, o fado é a vida. E a vida é.
Se murmura por entre as pedras da calçada em soluços é porque seguiu as frinchas que o caminho tinha.
Que se pode esperar?
O destino tem um saiote de tule de onde se vislumbram umas cuecas de velha. E cada camada é enlaçada em outra.
O destino não é feio, é um caminho. E a paisagem é.
Que se pode fazer?
O amor vestiu um corpete de veludo escarlate com borradelas de ouro. Pintou-se de pós e purpurinas. E chorou até melar tudo.
O amor não é triste, é parte. E a parte somos nós.
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sábado, 1 de maio de 2010
Hoje esqueci-me de coisas. De pedaços de mim que não encontro. Berloques mal colocados nalguma gaveta. Pedacinhos que não consigo encontrar por mais que desarrume. Esqueci-me dos sonhos e dos saltos estilhaçados debaixo da carpete numa varredela preguiçosa. E o ímpeto foi empurrado com o pé para trás do jarro. Na confusão fui-me perdendo, desarrumando o caminho.
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quinta-feira, 22 de abril de 2010
Naquele beco onde te escondes na ilusão de que és forte, quebrei-te em gemidos.
Foi numa noite demasiado quente para Janeiro que te encontrei no escuro. A tua face velada iluminada apenas pelo fumo de um cigarro perto do fim em tons espectrais de cinza. Todo o ambiente feito de contornos de fantasia e irrealismo. O vento fustigava e chicoteava. Talvez fosse essa a causa de tanto calor, a fricção das partículas. Ou então as nuvens que acasalavam desenfreadamente em clarões e rugidos extremos de êxtase. Queria evitar que o vento me levasse e o vento levou-me a ti.
E tu levaste-me.
Mas um trovão! E com a luz o teu olhar algemou-me.
Terceiro clarão.
A tua mão forte apertar-me a garganta, molhada, da intempérie e de medo. O rufar do meu coração era audível e as veias azuis pulsavam em contraste com a pele glaciar.
O som da tua voz ao roçar tirou-me do chão: "Cheiras a doces." E um tremor tomou de assalto o meu corpo.
"E tu cheiras a virilidade e pólvora. Caminhadas ao inferno e histórias no escuro. Cigarros inacabados. Meios fumados e poupados ao fim."
Rodopiou-me contra a parede num foutté arrebatado. Soltou-me as mãos e prendeu o tempo.
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segunda-feira, 19 de abril de 2010
Apaixonei-me pelo Sol e na sua luz banhei-me de cores. Deitava-me todas as noites com reminiscências dos seus raios na gélida prata da Lua... E de manhã são os seus beijos de oiro que procuro. Guiou-me por estações. E sou-as... Inconstante. Volúvel. Como calor de Inverno.
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